Lógica/Cálculo Proposicional Clássico/Operadores e Tabelas Veritativas
Tabelas de Verdade
Seja uma linguagem que contenha as proposições , e .
O que podemos dizer sobre proposição ? Para começar, segundo o princípio de bivalência, ela ou é verdadeira ou é falsa. Isto representamos assim:
A |
V |
F |
Agora, o que podemos dizer sobre as proposições e ? Oras, ou ambas são verdadeiras, ou a primeira é verdadeira e a segunda é falsa, ou a primeira é falsa e a segunda é verdadeira, ou ambas são falsas. Isto representamos assim:
A | B |
V | V |
V | F |
F | V |
F | F |
Como você já deve ter reparado, uma tabela para , e é assim:
A | B | C |
V | V | V |
V | V | F |
V | F | V |
V | F | F |
F | V | V |
F | V | F |
F | F | V |
F | F | F |
Cada linha da tabela (fora a primeira que contém as fórmulas) representa uma valoração.
Agora, o que dizer sobre fórmulas moleculares, como , ou ? Para estas, podemos estabelecer os valores que elas recebem em vista do valor de cada fórmula atômica que as compõe. Faremos isto por meio das tabelas de verdade.,
Os primeiros passos para construir uma tabela de verdade consistem em:
1º) Uma linha em que estão contidos todas as subfórmulas de uma fórmula. Por exemplo, a fórmula tem o seguinte conjuntos de subfórmulas: { , , , , , }
2º) linhas em que estão todos possíveis valores que os termos podem receber e os valores cujas as fórmulas moleculares tem dados os valores destes termos.
O número destas linhas é , sendo o número de valores que o sistema permite (sempre 2 no caso do CPC) e o número de termos que a fórmula contém. Assim, se uma fórmula contém 2 termos, o número de linhas que expressam a permutações entre estes será 4: um caso de ambos termos serem verdadeiros (V V), dois casos de apenas um dos termos ser verdadeiro (V F , F V) e um caso no qual ambos termos são falsos (F F). Se a fórmula contiver 3 termos, o número de linhas que expressam a permutações entre estes será 8: um caso de todos termos serem verdadeiros (V V V), três casos de apenas dois termos serem verdadeiros (V V F , V F V , F V V), três casos de apenas um dos termos ser verdadeiro (V F F , F V F , F F V) e um caso no qual todos termos são falsos (F F F).
Negação
A negação tem o valor inverso da fórmula negada. A saber:
A | ¬A |
V | F |
F | V |
- Interpretações: "Não ", "Não é o caso de ", "A proposição '' é falsa".
Assim, em uma linguagem na qual significa "Sócrates é mortal", pode ser interpretada como "Sócrates não é mortal", e, se o primeiro é verdadeiro, o segundo é falso; e se o primeiro é falso, o segundo é verdadeiro.
Interpretar a negação por meio de antônimos também é uma alternativa, mas deve-se ter cautela, pois nem sempre é aplicável em todos os casos. No exemplo acima a interpretação por meio de antônimos é perfeitamente aplicável, ou seja, se significa "Sócrates é mortal", pode ser interpretada como "Sócrates é imortal". Por outro lado, em uma linguagem na qual significa "João é bom jogador", a proposição "João é mau jogador" não é a melhor interpretação para (João poderia ser apenas um jogador mediano).
Pode-se adicionar indefinidamente o operador de negação:
A | ¬A | ¬¬A | ¬¬¬A |
V | F | V | F |
F | V | F | V |
“” significa “‘’ é falsa”.
“” significa “‘’ é falsa”.
E assim por diante.
Repare que é equivalente a , assim como é equivalente a .
A negação múltipla trás alguns problemas de interpretação. Interpretando mais uma vez por "Sócrates é mortal", podemos perfeitamente interpretar de diversar formas: "Não é o caso de que Sócrates não é mortal", "Não é o caso de que Sócrates é imortal", "É falso que Sócrates não é mortal", "É falso que Sócrates é imortal" etc. Contudo, nem sempre na língua portuguesa a dupla negação de uma proposição equivale à afirmação desta. Muitas vezes a dupla negação é uma ênfase na negação. Exemplos: "Não veio ninguém", "Não fiz nada hoje" etc.
Conjunção
- A conjunção entre duas fórmulas só é verdadeira quando ambas são verdadeiras. A saber:
A | B | A∧B |
V | V | V |
V | F | F |
F | V | F |
F | F | F |
- Interpretação: " e ", "Tanto quanto ", "Ambas proposições '' e '' são verdadeiras" etc.
Assim, em uma linguagem na qual significa "Sou cidadão brasileiro" e significa "Sou estudante de filosofia", pode ser interpretada como "Sou cidadão brasileiro e estudante de filosofia"; o que só é verdade se é verdade e é verdade.
Repare que a conjunção é comutável, ou seja, é equivalente a , a saber:
A | B | A∧B | B∧A |
V | V | V | V |
V | F | F | F |
F | V | F | F |
F | F | F | F |
A comutatividade da conjunção trás um problema para formalizar proposições da linguagem natural no Cálculo Proposicional Clássico, pois a ordem em que as orações aparecem pode sugerir uma seqüencia temporal. Por exemplo "Isabela casou e teve um filho" é bem diferente de "Isabela teve um filho e casou". Repare que o mesmo problema não acomete a proposição "Isabela é casada e tem filhos", que é equivalente a "Isabela tem filhos e é casada". Esta sentença é, portanto, perfeitamente formalizável no Cálculo Proposicional Clássico por meio de uma conjunção.
Proposições que levam a palavra "mas" também podem ser formalizadas pela conjunção. Por exemplo, em uma linguagem na qual significa "João foi atropelado" e significa "João sobreviveu ao atropelamento", as sentenças "João foi atropelado e sobreviveu" e "João foi atropelado, mas sobreviveu" podem ambas serem formalizadas assim:
Afinal, ambas proposições afirmam os mesmos eventos na mesma seqüencia: o atropelamento e a sobrevivência de João. A única diferença entre ambas é que aquela que leva "mas" expressa que uma expectativa subjetiva não foi satisfeita, o que não importa para a lógica.
Disjunção
- A disjunção entre duas fórmulas só é verdadeira quando ao menos uma delas é verdadeira. A saber:
A | B | A∨B |
V | V | V |
V | F | V |
F | V | V |
F | F | F |
Repare que a disjunção também é comutativa:
A | B | A∨B | B∨A |
V | V | V | V |
V | F | V | V |
F | V | V | V |
F | F | F | F |
- Interpretação: " ou ", "Entre as proposições e , ao menos uma é verdadeira".
Assim, se significa "Fulano estuda filosofia" e significa "Fulano estuda matemática", pode ser interpretada como "Fulano estuda filosofia ou matemática"; o que só é falso se nem nem forem verdadeiras.
Com a disjunção é preciso tomar muito cuidado tanto na interpretação de fórmulas quanto na formalização de proposições, pois na linguagem natural muitas vezes os disjuntos são excludentes. Por exemplo: "Uma moeda ao ser lançada resulta em cara ou coroa", "Nestas férias eu vou viajar ou ficar em casa".
Para estes casos usamos a disjunção exclusiva ou a bi-implicação combinada com a negação, como veremos mais adiante.
Implicação
A implicação entre duas fórmulas só é falsa se a da esquerda (antecedente) for verdadeira e da direita (conseqüente) for falsa. A saber:
A | B | A→B |
V | V | V |
V | F | F |
F | V | V |
F | F | V |
- Interpretação: "Se , então ", " implica em ", "Se a proposição '' é verdade, então a proposição '' também é verdade", "A partir de '' inferimos '".
Assim, se, em uma linguagem , significa "O botão vermelho foi apertado" e significa "O lugar todo explode", , pode ser interpretada como "Se o botão vermelho foi apertado, o lugar inteiro explode", o que só é falso se o botão vermelho for apertado (verdade de ) e o lugar não explodir (falsidade de ):
A interpretação da implicação é uma das mais complicada. Talvez você tenha estranhado que a implicação seja verdadeira quando o antecedente é falso. Ou ainda, você poderia objetar "mas e se o botão for apertado, o lugar explodir mas uma coisa não ter nada a ver com a outra?".
Quando temos na linguagem natural uma proposição que afirma que a partir de um evento outro segue inexoravelmente (por exemplo: "Se você sair na chuva sem guarda-chuva ou capa de chuva, então você vai se molhar") ou uma proposição que afirma que podemos deduzir um fato de outro (por exemplo: "Se todo número par é divisível por 2, então nenhum número par maior que 2 é primo"), podemos seguramente formalizar estas proposições por meio da implicação.
Mas o contrário, ou seja, interpretar uma implicação a na linguagem natural, é problemático. Podemos estar lidando com uma implicação cujo o antecedente e o conseqüente não tem relação alguma. Bastando que o antecedente seja falso ou o conseqüente seja verdadeiro para que a implicação seja verdadeira. Nestes casos, é bem difícil dar uma interpretação satisfatória para a implicação.
Bi-implicação
- A bi-implicação, , pode ser descrita como , ou seja, implica em e implica em . A bi-implicação entre duas fórmulas é verdadeira quando ambas são verdadeiras ou ambas são falsas. Assim, se significa "Isto é um ser humano" e significa "Isto é um animal racional", pode ser interpretada como "Isto é humano se e somente se é animal racional", o que só é falso se isto for um ser humano que não é animal racional (verdade de e falsidade de ) ou se isto for um animal racional que não é ser humano (falsidade de e verdade de ):
A | B | A↔B |
V | V | V |
V | F | F |
F | V | F |
F | F | V |
Conectivos menos usuais
- Ainda há outros conectivos interessantes, mas que não serão necessários em nossos estudos. Merecem, portanto, uma rápida menção.
Adaga de Quine
- A adaga de Quine, , pode ser descrita como , ou seja, não e não . Assim, é verdadeiro somente se ambos, e , forem falsos. Trata-se, portanto, da negação da disjunção:
A | B | A∨B | A↓B |
V | V | V | F |
V | F | V | F |
F | V | V | F |
F | F | F | V |
Disjunção Exclusiva
- A disjunção exclusiva, , pode ser descrita como , ou seja, não é o caso de não e não e não é o caso de e . A disjunção exclusiva entre duas fórmulas é verdadeira somente se apenas uma delas for verdadeira. Assim, se significa "Fulano estuda filosofia" e significa "Fulano estuda matemática", pode ser interpretada como "Ou Fulano estuda filosofia ou estuda matemática"; o que só é falso se ambos forem verdadeiros ou se ambos forem falsos. Trata-se, portanto, da negação da bi-implicação:
A | B | A↔B | A∨B |
V | V | V | F |
V | F | F | V |
F | V | F | V |
F | F | V | F |
Uso de parênteses e fórmulas com mais de um operador
- Assim como na aritmética e algebra, os parênteses na lógica indicam o que considerar primeiro. Portanto, a fórmula consiste na negação da conjunção entre e , enquanto a fórmula consiste na conjunção entre a negação de e .
- A diferença entre as fórmulas fica clara na tabela de verdade:
A | B | ¬A | A∧B | ¬(A∧B) | ¬A∧B |
V | V | F | V | F | F |
V | F | F | F | V | F |
F | V | V | F | V | V |
F | F | V | F | V | F |
- Da mesma forma, é distinta de . A saber:
A | B | C | A→B | B→C | (A→B)→C | A→(B→C) |
V | V | V | V | V | V | V |
V | V | F | V | F | F | F |
V | F | V | F | V | V | V |
V | F | F | F | V | V | F |
F | V | V | V | V | V | V |
F | V | F | V | F | F | V |
F | F | V | V | V | V | V |
F | F | F | V | F | V | V |
- Contudo, tem-se que a fórmula é equivalente à , pois ambas só serão verdadeiras se , e forem verdadeiras.
- Da mesma forma, é equivalente à (ambas só são falsas quando todos termos são falsos), e é equivalente à .
- Devido a isto, vale como convenção informal as construções , e .
Exercícios
Seja uma linguagem na qual:
significa "Russell desenvolveu a teoria das descrições".
significa "Gödel é matemático".
significa "Está chovendo".
Formalize no CPC as seguintes proposições e faça a tabela de verdade de cada uma delas:
- "Não está chovendo".
- "Russell desenvolveu a teoria das descrições e Gödel é matemático".
- "Russell desenvolveu a teoria das descrições ou Gödel não é matemático".
- "Se Gödel é matemático, então está chovendo".
- "Se não está chovendo, então Gödel não é matemático".
- "Nem está chovendo, nem Russell desenvolveu a teoria das descrições".
- "Russell não desenvolveu a teoria das descrições se e somente se está chovendo".